domingo, 17 de fevereiro de 2019

Totus Tuus - Il est vivant!

Maria e a missão



Não compreendo cristianismo sem Maria. Por mais que se negue seu protagonismo na vida missionária da Igreja, esta não existiria sem seu sim, sua disponibilidade serviçal ao projeto de Deus em sua vida. Foi Maria o embrião de uma proposta de amor de Deus às suas criaturas. Sem ela, a história cristã não aconteceria. Portanto, fica claro a qualquer cristão mais consciente o valor de Maria na vida da Igreja; esta que se deixou usar por Deus para que Jesus se inserisse em nossa caminhada.
Cristão que nega essa maternidade ou menospreza sua importância, nega também seu Filho.  Não há como separar a figura da mãe do encanto e beleza de sua criança. Em tudo se assemelham. Até na missão que Deus lhes reservou. Tal mãe, tal filho.
Assim refletir é resgatar os passos e atitudes de uma mulher determinada a cumprir sua missão em todos os detalhes. Não foi ela a primeira alma viva a acolher em si própria a vontade de Deus em sua plenitude? “Faça-se em mim segundo a sua vontade”? Não foi ela a primeira missionária a anunciar pessoalmente à família de João Batista, o precursor, que o Reino de Deus estava próximo, ganhava forma em seu ventre? “Você é bendita entre as mulheres, e é bendito o fruto do seu ventre!”, exclamou-lhe Isabel ao vê-la portadora da mais bela gravidez do gênero humano. Não foi ela a paciente zeladora e primeira grande admiradora de seu menino preocupado em ensinar naquele templo, entre os doutores? “Não sabeis que devo preocupar-me com as coisas do meu Pai”? Não foi ela a primeira intercessora do grande milagre de um novo tempo (o vinho novo das bodas), cuja realização só se deu graças à sua intervenção? “Façam tudo o que ele vos disser…” Não foi ela a mulher paciente que o ouvia à distância, dando espaço às multidões que o cercavam e renunciando sempre aos direitos que a própria maternidade lhe concedia? “Minha mãe e meus irmãos são aqueles que ouvem a Palavra de Deus, e a põem em prática”. Como deve ter lhe sido doloroso ouvir essas palavras!
Ser mãe é renunciar. É criar para o mundo, mesmo à distância. É olhar ao longe um rebento que cresce, que verga, que adquire forças e um dia parte, sem olhar para trás. Mas ao Filho sempre resta a certeza de que aquele colo que o embalou, aqueles seios que o amamentaram, aquele sorriso que aliviava suas dores, aquele olhar reluzente de esperança e de ânimos, não lhe faltariam nunca. A mãe, de uma forma ou de outra, tinha endereço fixo em seu coração e velaria por ele em qualquer circunstância, em qualquer necessidade. O seu Filho já não mais lhe pertencia. Mas as multidões lhe davam graças: “Feliz o ventre que te carregou, e os seios que te amamentaram”. Ou seja: obrigado mãe pelo presente que nos destes!
A obra missionária da Igreja nasceu do sim de Maria. Por isso é ela a estrela da evangelização, a primeira grande missionária da fé nascida de seu ventre, a mãe de Deus e da Igreja… Sem ela não teríamos a Redenção. Tanto que o próprio Redentor nos presenteou com sua maternidade, confiando-a a proteção do discípulo que mais amava: “Mulher, eis aí o seu filho”. Depois disse ao bom discípulo, aquele que nos representou aos pés da cruz: “Eis aí a sua mãe”.  Esse é o detalhe que nos falta na prática da devoção mariana. Não questão de desvio de foco da obra redentora – como nos acusam alguns – mas preservação, proteção, acolhimento e gratidão a tudo e por tudo que Maria nos proporcionou e continua a nos proporcionar com sua presença e bênçãos maternais. Foi após a consumação de tudo, da maior dádiva de amor que Deus nos fez, foi nesta hora insana, porém magnânima que “o discípulo a recebeu em sua casa”. A missão de Maria continua em nosso meio, nossa casa comum.

Colunista : Wagner Pedro Menezes

Retirado do Site "Catequese CATÓLICA", http://catequesecatolica.com.br , em 17.02.2019. 

sábado, 16 de fevereiro de 2019

Heureux, Bienheureux

O elogio da imperfeição - O caminho da fragilidade



[Sugestão de] Leitura: "O elogio da imperfeição - O caminho da fragilidade"
«O Cristianismo tornou-se frequentemente uma religião a "tender para o perfecionismo moral" (confundindo-o com a santidade), como se fosse a única condição para obter o amor de Deus e os seus dons. Mas o único dom que Deus poderá conceder-nos não será senão Ele próprio, quer dizer, amor, perdão e misericórdia.»
Este é o ponto de partida para o livro "O elogio da imperfeição - O caminho da fragilidade", de Paolo Scquizzato, que integra os mais recentes lançamentos da Paulinas Editora.
«A nossa salvação chegará, não quando tivermos derrotado as nossas misérias, mas quando começarmos a viver a verdade de nós mesmos, isto é, quando começarmos a aceitar-nos com as nossas fragilidades. Nós somos as nossas imperfeições, as nossas feridas e os nossos pecados», assinala a sinopse.
"A riqueza do limite". "Hino à fragilidade", "Basta-nos a sua graça" e "A lógica da debilidade" são os capítulos que compõem a primeira parte do livro, seguida da secção "À escuta do Evangelho", que após a introdução medita sobre duas narrativas evangélicas: "O cego de nascença" e "A filha de Jairo e a hemorroíssa".
É do primeiro capítulo que extraímos o excerto que oferecemos aos nossos leitores.

A riqueza do limite
In "O elogio da imperfeição"
Transformar as feridas em pérolas
A pérola é esplêndida e preciosa.
Nasce da dor.

Nasce quando uma ostra é ferida.
Quando um corpo estranho – uma impureza, um grãozinho de areia – penetra no seu interior e a habita, a concha começa a produzir uma substância (a madrepérola) com que o cobre para proteger o seu corpo invadido. No fim, ter-se-á formado uma bela pérola, brilhante e valiosa. Se não for ferida, a ostra nunca poderá produzir pérolas, porque a pérola é uma ferida cicatrizada.
Quantas feridas temos dentro de nós, quantas substâncias impuras nos habitam? Limites, debilidades, pecados, incapacidades, inadequações, fragilidades psicofísicas... E quantas feridas nas nossas relações interpessoais? Para nós, a questão fundamental será sempre esta: o que fazemos com elas? Como as vivemos?
A única via de saída é envolver as nossas feridas com aquela substância cicatrizante que é o amor; a única possibilidade de crescer e de ver as nossas impurezas tornarem-se pérolas.
A alternativa é cultivar ressentimentos contra os outros pelas suas debilidades e atormentarmo-nos a nós mesmos com permanentes e devastadores sentimentos de culpa por aquilo que não deveríamos ser e por aquilo que não deveríamos sentir.
A ideia que frequentemente trazemos em nós é que deveríamos ser de outro modo; que, para sermos aceites por nós próprios, pelos outros e por Deus, não deveríamos ter dentro de nós aquelas impurezas indecorosas. Quereríamos ser simples «ostras vazias», sem corpos estranhos de vários géneros, «puros», em suma. Mas isto é impossível, e, mesmo que nos considerássemos tais, isso não significaria que nunca fomos feri dos, mas apenas que não o reconhecemos, que não conseguimos aceitá-lo, que não soubemos perdoar-nos e perdoar, compreender e transformar a dor em amor; e seríamos simplesmente pobres e estaríamos terrivelmente vazios.
É fundamental chegar a compreender a importância – em nós e fora de nós, nas nossas relações – da presença dos limites, das feridas, das zonas de sombra; perceber, à luz da mensagem evangélica, que tudo o que do nosso e do mundo interior alheio, está marcado pela sombra e pelo limite, é a nossa única riqueza, e que é precisamente então que é possível fazer a experiência da nossa salvação. Em suma, que não há nada dentro de nós que mereça ser atirado fora.
«Tudo pode ser transformado em graça, até o pecado, dizia Agostinho. Até a nossa sexualidade ferida e as nossas neuroses, acrescentaremos nós, desde que façamos delas uma ocasião para nos abrirmos, para acolhermos e compartilharmos. Por isso, erraríamos se as desprezássemos. São matéria de santidade» (André Daigneault, La via dell’imperfezione, Cantalupa, Effatà Editrice, 2012, p. 17).
Se começamos a raciocinar deste modo, quer dizer que se realizou em nós a verdadeira conversão, a metanoia evangélica; tornámos nosso um pensamento «outro», diferente, ou, então, chegamos finalmente a já não pensar que a «pureza», a ausência de debilidade e de pecado, é a nossa salvação, bem pelo contrário! A salvação, a santidade, consistirá finalmente em nos apercebermos da nossa verdade, ou seja, de que estamos feridos, somos limitados, frágeis; mas, ao mesmo tempo, objeto do amor «louco» de Deus que – precisamente porque somos feitos assim – vem visitar-nos e habitar-nos.
«A santidade tem tão pouco a ver com a perfeição que é o seu oposto absoluto. A perfeição é a irmã mais nova mimada da morte. A santidade é o gosto forte pela vida tal como é – uma capacidade infantil de alegrar-se com aquilo que é, sem pedir nada mais» (Christian Bobin).
O Evangelho revela continuamente que tudo o que tem o sabor do limite também encerra em si a possibilidade da sua realização.
Jesus diz a cada um de nós: «Ama aquela parte de ti que gostarias de não ter. Começa por envolvê-la com o amor e, no fim, verificarás que tens em ti uma pérola preciosa, porque na ferida reconhecida, envolta pelo amor, experimentarás o tesouro que trazes dentro de ti.»
Com insistência, o Evangelho exorta-nos a «pôr no meio» o nosso limite e a nossa fragilidade (cf. o homem com a mão paralisada, Mc 3,3 e Lc 6,8; o paralítico, Lc 5,19). Colocar no meio as nossas zonas de sombra quer dizer reconhecer, de um lado, a sua existência e, do outro, que elas, diante da ressurreição de Cristo, não são a última palavra sobre a nossa humanidade.
Devemos decidir se optamos pela força ou pela debilidade.
A nossa insuficiência, a nossa debilidade, é uma força maior do que qualquer outra, porque tem a própria força de Deus: «Quando sou fraco, então é que sou forte» (2 Cor 12,10).
Esta verdade deveria voltar ao centro do nosso viver cristão. Como já dissemos, nos Evangelhos, no centro da cena está sempre o homem na sua doença, enquanto ser ferido, débil e frágil. Por isso, também no centro da assembleia (da comunidade, da nossa família, da Igreja...), no centro do nosso viver cristão, não sobressaem a força, o «faça-o você mesmo», a observância obsessiva dos santos preceitos, o sermos moralmente irrepreensíveis..., mas está simplesmente a nossa fraqueza.
Reconciliar-se com o limite
Devemos recuperar a realidade do limite e reconciliarmo-nos com ela. Só existimos enquanto limitados. Nascemos e morreremos, pelo que somos limitados no tempo. Temos um corpo, cujos contornos definem a nossa fronteira com o mundo circunstante, e isso diz-nos que somos limitados no espaço. Quereríamos ser capazes de amar mais, relacionarmo-nos de maneira diferente, mas todos os dias fazemos a experiência de que «somos feitos assim» (cada um tem a sua história, a sua estrutura psicológica, o seu carácter, as suas doenças interiores...): somos limitados no amor.
Para não falar no limite do outro que, enquanto diferente de nós, não nos permite ser o que quereríamos, e, por isso, percebemo-lo como limitador. A alteridade, dentro e fora de nós, frustra o nosso desejo de «como deveriam ser as coisas»; mas existe e não podemos ignorá-la. A alteridade, quando nos causa medo, assume o nome de inimigo. E o inimigo é sempre para combater e, possivelmente, destruir.
Hoje, em geral, entendemos o limite de maneira negativa: representa para nós constrição, impedimento e sufocamento, enquanto para os gregos antigos permitia estabelecer os contornos do bem e do mal. O vício e o pecado estavam no excesso; a virtude e o bem tinham que ver com o meio, ou seja, um range [gama] – diríamos hoje – situada entre os limites extremos.
De facto, no horizonte ético dos antigos, o erro mais grave era a hybris, a desmesura, o excesso que ultrapassa os limites. Hoje, pelo contrário, a palavra limite e tudo aquilo que tem o sabor de limitativo soa a coerção e, por isso, como totalmente negativo: sabe a dependência, inferioridade, falta, portanto, a alguma coisa de que é preciso livrarmo-nos o mais depressa possível.
Hoje, tudo deve ser off limits, desde a investigação científica ao desporto, passando por todos os aspetos do quotidiano: os contratos são anuláveis, as relações de trabalho são efémeras e substituíveis, a palavra dada e a promessa feita são irrelevantes; também se ultrapassou o limite da vergonha, pelo que o réu já não precisa de se arrepender ou de pedir desculpa. As novas tecnologias e os novos media comprimiram de tal maneira o tempo e inutilizaram tanto o espaço que conduziram à rejeição da ideia do fim e, consequentemente, do confim.
Daqui se conclui que o limite último da vida, ou seja, a morte, confim com o mistério de fim, já não pode ser aceite. O limite da morte é anacrónico e absurdo; por isso, é de algum modo imperioso que sejamos imortais, infinitos.
Depois, como já vimos, há a experiência do limite que nos é imposta pelo outro, pela qual percebemos o tu como realidade lesiva da nossa liberdade, do facto de termos razão, das nossas ideias, do nosso sucesso, do facto de sermos «os primeiros», se não até os únicos.
Tudo isto é esplendidamente contado no episódio do Génesis, onde Caim, filho único, perde o seu status com a chegada de Abel, o segundo filho. Para ele, voltar a ser o único, não tem outra solução a não ser eliminar o antagonista (cf. Gn 4,1-8).
Etimologicamente, eliminar quer dizer expulsar (o e-privativo) da soleira da porta (limen, liminis): pôr/atirar para fora de casa, da sua história, o outro, que não permite que se seja o que se quereria, possibilitando o nosso ser ilimitado.
Da negação do limite a uma vida inautêntica
Christian Bobin escreve:
«Nunca me empolguei muito por exames. Não que fosse mau aluno, como sói dizer-se. Quando adivinhava o que se esperava de mim, então eu dava-o. Fazia da arte de aprender uma arte deveras subtil da oferta; é preciso dar ao outro o que ele espera de nós, e não o que desejamos para nós. O que se espera de nós, não aquilo que somos.
Porque o que ele espera nunca é o que nós somos, é sempre outra coisa. Portanto, aprendi muito depressa a dar aquilo que não tinha» (Elogio do nada).
O homem é um esplêndido ator. O drama que representa é viver segundo aquilo que os outros esperam dele, e não o facto de ser realmente capaz de realizar a sua história, quer dizer, a verdade.
O problema é que o outro espera sempre de nós algo diferente do que somos; isto comporta, inevitavelmente, que demos e manifestemos sempre aquilo que não temos e que, afinal, não somos. A questão será sempre parecermos aos outros que somos perfeitos, não manchados por limites ou fragilidades, isto é, que vivamos através daquelas performances que eles esperam de nós e que nos tornam bem aceites, bem-queridos. Amados.
Aprendemos isto desde pequeninos em relação aos nossos pais, para, depois, vivê-lo com os professores, os educadores, os empregadores, o nosso partner, com nós próprios e com Deus.
Mas não se pode viver uma vida assim; não se pode resistir a um esforço continuado de nos mostrarmos adequados, performantes, perfeitos, para tranquilizar os outros a fim de lhes dar prazer.
«Um princípio basilar para o nosso percurso de vida é: «Não te deixes condicionar pelos outros. Não permitas que os outros te prescrevam a estrada que deves percorrer. Vai pela tua estrada. Torna-te tu próprio. Descobre a forma autêntica e incontaminada que o Senhor te atribuiu. E tem a coragem de viver o aspeto originário de ti mesmo. Quem eras antes de os teus pais te educarem? Quem eras em Deus, antes de nasceres?» Lembra-te do teu núcleo divino. Se entrares em contacto com ele, poderás percorrer livremente a tua estrada (Anselm Grün, O livro da arte de viver).
O nosso drama de cristãos é desejarmos ser performantes, até diante de Deus. Fizemos do Cristianismo a religião do «tender para o perfecionismo moral» – confundindo-o com a santidade –, como se fosse a única condição para obter o amor de Deus e os seus dons. Mas o único dom que Deus poderá conceder-nos não será senão Ele próprio, quer dizer, amor, perdão e misericórdia. E Deus só me poderá dar tudo isto quando eu me reconhecer necessitado de amor, pecador e pobre.
«A santidade que Jesus nos propõe não é de ordem natural, mas é uma santidade que devemos acolher na nossa pobreza. Jesus veio para os pecadores e para os débeis, e não para os fortes que estão bem. O esquema de perfeição humana baseado na vontade e na ascese segue um traçado exatamente oposto ao da santidade que Jesus nos propõe no Evangelho» (André Daigneault, La via dell’imperfezione [A vida da imperfeição], cit., p. 24)
A nossa salvação chegará, não quando tivermos derrotado as nossas misérias, mas quando começarmos a viver a verdade de nós mesmos, isto é, quando começarmos a aceitar-nos com as nossas fragilidades. Nós somos as nossas imperfeições, as nossas feridas e os nossos pecados. Não somos outra coisa, embora talvez o desejemos, mesmo que nos escondamos atrás das máscaras e recitemos guiões que não nos pertencem.
O Evangelho é uma escola de realismo. Jesus veio arrancar-nos as máscaras de histriões para que, finalmente, estejamos livres para ser nós próprios, mesmo que nos custe ou tenhamos de parecer inadequados e loucos aos olhos do mundo.
«Perguntas-me de que modo me tornei louco. Aconteceu assim: um dia, muito antes que muitos fossem gerados, acordei de um sono profundo e apercebi-me de que me tinham sido roubadas todas as máscaras – as sete máscaras que em sete vidas eu tinha forjado e colocado –, e sem máscara corri pelas ruas cheias de gente, gritando: "Ladrões, ladrões, malditos ladrões!" Riam-se de mim homens e mulheres, e alguns precipitaram-se para as suas casas com medo de mim. E, quando cheguei à praça do mercado, um jovem gritou, do telhado de uma casa: "É um louco!" Virei os olhos para cima para o ver; pela primeira vez, o sol me beijou o rosto, o meu rosto nu. O sol beijava pela primeira vez o meu rosto descoberto e a minha alma incendiava-se de amor pelo sol, e já não chorava as minhas máscaras. E, como se estivesse em transe, gritei: "Abençoados, abençoados sejam os ladrões que roubaram as minhas máscaras!" Foi assim que me tornei louco. E na loucura encontrei a liberdade e a salvação: fui libertado da solidão e salvo pela compreensão, porque aqueles que nos compreendem dominam sempre alguma coisa em nós» (Khalil Gibran, O louco).
Jesus veio libertar-nos do medo de não estarmos à altura diante de quem quer que seja: nós próprios, o outro, Deus. Adão, o homem de sempre, escondeu-se por causa disto. Estava nu e teve medo. Diante de Eva defendeu-se, acusando-a; diante de Deus, escondeu-se no abismo.
O Evangelho é uma contínua memória da encarnação; o Deus que se pôs ao nosso lado não veio tirar-nos a inadequação, a fragilidade, o limite, mas libertar-nos do medo que tudo isto exerce em nós, para que não sejamos esborrachados sob este peso enorme.
É preciso restituir às nossas feridas o direito de cidadania!
A relação com nós próprios e com a nossa vida quotidiana (social, familiar e relacional) tornar-se-á «paradisíaca» quando conseguirmos acolher-nos e amar-nos, não de malgrado, mas através de todas as nossas feridas e das nossas debilidades.
Uma comunidade – seja ela civil, familiar ou religiosa – será um paraíso, não quando todos forem perfeitos e não houver tensões, mas quando cada um puder viver a liberdade de tirar a máscara porque se sente aceite e amado tal como é; quando limites, pecados, feridas e traições já não forem ocasiões de divisão e de maldições, mas lugares onde se pode amar e perdoar.
Publicado em 24.05.2016+”

Retirado do Site do  Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura , https://www.snpcultura.org , em 16.02.2019.

sábado, 9 de fevereiro de 2019

SEGUIR JESUS, PAGOLA


Viver em redes... sem enredar-se



“Avança para águas mais profundas, e lançai vossas redes...” (Lc 5,4) 
Indiscutivelmente, Jesus é o misterioso visitante que cada dia chega até nós para advertir que precisamos de nos libertar do tedioso cotidiano, quando ele se torna convencional e, não raro, carregado de desencanto, pesado, estressante... Corremos o risco de sermos apenas imitadores ou repetidores, pois tememos nos perder na busca do novo, bloqueando o desenvolvimento pessoal e comunitário. 
O encontro com Jesus nos arranca da rotina, do “sempre fizemos assim” e nos desafia a “pescar” de maneira diferente; sua presença alarga nossa mente e nosso coração instigando-nos a sair dos nossos estreitos mares e entrar no movimento do vasto mar que Ele nos oferece. 
Em que grau Sua presença nos desperta para aquilo que devemos ser como seus(suas) seguidores(as)? São grandes os riscos de vivermos em mares tão estreitos; é cómodo perceber, delimitar, defender e fechar-nos no próprio mar. Isso fazemos de maneira tão zelosa que nem vemos aquilo que está para além da margem onde nos estabilizamos.   
Tal estreiteza de vida aprisiona a solidariedade e dá margem à indiferença, à insensibilidade social, à falta de compromisso com as mudanças que se fazem urgentes. O próprio espaço se torna uma couraça e o sentido do serviço sai do horizonte inspirador de tudo aquilo que se faz.
Hoje, o lago de Tiberíades se converteu numa grande rede que abarca o mundo inteiro. Mas, o que as pessoas buscam nessa grande rede? E, sobretudo, o que estamos oferecendo nela para evangelizar? 
Com um só click podemos chegar a milhões de pessoas, podemos fazer muito bem, mas também podemos criar muita confusão e inclusive repulsa, podemos levar a mensagem de Jesus ou simplesmente fazer transparecer todo o nosso ego inflado, cheio de si mesmo. As redes sociais têm seus perigos, mas também tem suas grandes oportunidades que não podemos desperdiçar. Vamos nos dando conta que, enquanto não evangelizemos a partir dos meios eletrónicos modernos, não poderemos encher nossas redes de peixes. O seguimento de Jesus implica hoje a necessidade de evangelizadores nas redes sociais. 
Tendo as ferramentas em mãos (nossas pobres barcas e redes) e sendo portadores de uma mensagem de vida (o evangelho) somos movidos por Jesus a “ser pescadores do humano”. No mar das redes sociais ressoa mais uma vez o apelo de Jesus: “fazei-vos pescadores do humano”. Frente a esta nova realidade, que tipo de profecia responde melhor a nossa peculiar forma de cooperar na missão do Espírito do Abbá e de Jesus. 
Estamos no mundo das telas: através delas nos interconectamos, transmitimos informações, saberes. As diversas telas tendem à convergência: com um só dispositivo, fixo ou móvel, podemos falar, enviar e receber fotos, música, vídeos e qualquer tipo de arquivo; com o “boom” das redes sociais podemos fazer isso com o grupo que elegemos em cada momento. 
Se há algo que caracteriza nosso tempo é a nova consciência de ser rede-comunhão-interconexão-unidade. Encontramo-nos em um tempo surpreendente: as espetaculares inovações tecnológicas nos convidam a entrar numa inimaginável rede de informações, imagens, conexões... Nosso planeta está dotado de uma complexíssima textura de comunicações. Com apenas alguns clics oferece-se, diante de nós, um mundo complexo, de graça e maldade, de alianças para o bem e para o mal, de luzes e trevas. 
E aí estamos nós, seguidores(as) de Jesus, “em-redados(as)”, nos perguntando por nossa identidade cristã, na vivência do Evangelho e na missão de nos fazer presentes neste “novo mundo”. Todos já sabemos que tudo está interconectado: a globalidade é interação. Lentamente vai-se tomando consciência de que formamos parte de um todo. A realidade vai se revelando como um manto sem costuras, sem fraturas, onde todos estamos implicados e comprometidos. 
“Rema mar adentro!”, ressoa a voz de Jesus. A multidão permanece em terra; somente Pedro e seus companheiros se adentram no mar profundo. Este apelo de Jesus é muito simbólico. Em grego “bados” e em latim “altum” significam profundidade (alto mar); só nas profundezas é que se pode extrair o mais autêntico do ser humano, o que é mais nobre e divino. 
Tudo o que, em vão, buscamos na superfície, está dentro de nós. Mas, ir mar adentro não é tão fácil como pode parecer. Exige ultrapassar as seguranças do “eu superficial” e adentrar-nos nas incontroladas águas de nosso ser profundo. Confiar naquilo que não controlamos exige uma fé-confiança autêntica. Dizia Teilhard de Chardin: “Quando descia ao profundo de meu ser, chegou um momento em que não ‘dava mais pé’ e parecia que me deslizaba para o vazio”. 
O mar era o símbolo das forças do mal. “Pescar homens” era um dito popular que significava tirar alguém de um perigo grave. Não quer dizer, como se entendeu com frequência, fazer proselitismo ou converter as pessoas à força para a religião cristã. Aqui quer dizer: ajudar as pessoas a sair de todas as opressões que lhe impedem crescer e desenvolver suas potencialidades. Só pode ajudar o outro a sair da influência do mal aquele que encontrou o que é mais verdadeiro e nobre dentro de si mesmo. 
Neste contexto atual, onde corremos o risco de nos converter em pessoas “grudadas [viciadas]” a uma tela, se faz mais necessário que nunca humanizar a rede para “pescar o humano” que está escondido no oceano interior de cada um. Esta humanização requer, em primeiro lugar, muita responsabilidade. 
Tudo isto nos leva a pensar que na rede há uma grande necessidade de silêncio (“silêncio na rede”), precisamente para que possamos ouvir a verdade com amor. Há excessivas palavras que afogam, notícias falsas, “bullings”, campanhas desqualificadoras e comentários feitos com extrema má educação. Sobretudo nas páginas religiosas, precisamos de um silêncio construtivo para que se escute a verdade que liberta. 
Silêncio construtivo significa utilizar uma linguagem propositiva, compreensiva, que estenda pontes de diálogo, que escute o outro que é diferente, que leve em conta o que “o outro” diz, talvez um aspecto da realidade que nos tinha escapado.
Silêncio construtivo significa tomar partido pelos mais fracos e excluídos; significa usar uma linguagem que sare as feridas, que reconstrua os vínculos quebrados. Uma página (mensagem) que só busca condenar, que só revela intolerância e preconceito, não pode ser evangélica. Literalmente, “há demasiado disparos” que desumanizam. Precisamos do azeito [óleo] do consolo que cura as feridas, o vinho da esperança que nos une como irmãos acima das diferenças, o pão da compaixão que alimenta e eleva … 
É preciso fazer a “travessia” do estreito mar de nossa vida, onde nossas inúteis barcas e redes só “pescam” futilidades e lixo, para o grande oceano que Jesus nos oferece, carregado de vida e vida em plenitude. 
Texto bíblico:  Lc 5,1-11 
Na oração: “Rema mar adentro e desce ao profundo de teu ser!” É um convite dirigido a todo ser humano. Sem essa profundidade, não é possível a plenitude humana. A contemplação é o único caminho.
“Não é necessário que percorras os mares buscando alimento; aprende a pescar em teu próprio mar interior; o que com tanto afinco buscas fora de ti, já tens ao alcance da mão, dentro de ti. Se não tens pescado nada, que poderás oferecer aos outros? Se não tens aprendido a pescar, como poderás ensinar a outros? Dá verdadeiro sentido à tua vida e ajudarás os outros a atingir o mesmo”. (cf. Fray Marcos)
Pe. Adroaldo Palaoro sj

"Retirado em 09.02.2018 do site - CATEQUESE Hoje-"  www.catequesehoje.org.br  "- Um site com brasileiro com muita qualidade!"
Imagem- Retirada da "google imagens" 

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Oración de san Francisco de Asís | Oración simple | Un regalo para el Pa...



Oração de São Francisco
Senhor, fazei de mim um instrumento da vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor.
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão.
Onde houver discórdia, que eu leve a união.
Onde houver dúvidas, que eu leve a fé.
Onde houver erro, que eu leve a verdade.
Onde houver desespero, que eu leve a esperança.
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria.
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, fazei que eu procure mais:
consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe.
É perdoando que se é perdoado.
E é morrendo que se vive para a vida eterna.