"Natal:
estamos em um tempo que nos fala do essencial: um Deus que se faz carne, o
divino que se faz humano; o eterno se estremece diante do que é terno; o
infinito abraça amorosamente a fragilidade... Viver este mistério é viver
em Deus, compreender até onde chega a loucura de amor de um Deus que se
humaniza para que nos humanizemos. “A humanidade de Cristo é a humanidade
vivida à maneira de Deus, ou melhor, vivida por Deus” (José Arregi).
“Deus
se humanizou”: tal expressão revela que a Misericórdia de Deus significa também
ternura. Apareceu um Menino: apareceu a ternura e a doçura do Deus que salva.
Na fragilidade de uma criança se esconde e se revela a grandeza divina. Uma
antiga tradição religiosa afirma que a maior seriedade de Deus aconteceu quando
Ele virou menino. Louca aventura amorosa de Deus! No rosto de uma
criança se faz visível a Misericórdia que desce sempre mais abaixo, que nasce
no ventre da terra e se faz terra fértil.
Segundo
Jacob Boehme, místico medieval, Deus é uma Criança que brinca... É nessa
atmosfera “infantil” que Deus se aproximou de nós. Não veio como um imperador
poderoso nem como um sumo-sacerdote ou um grande filósofo. Deus pode ser
encontrado não na estrada suntuosa do domínio e do poder, mas na estrada da
doação, da partilha, da solidariedade... A única explicação da “descida” de
Deus é seu “amor compassivo”. Ele mergulhou na nossa fragilidade fazendo-se uma
criança pobre, que nasce na periferia, no meio de animais, deitada numa
manjedoura... para que ninguém se sentisse distante d’Ele, para que todos
pudessem experimentar o sentimento de ternura que uma criança desperta e
sobre quem nos dobramos, maravilhados. Criança não infunde medo; todos se
aproximam dela. Pequenino com os pequeninos, Deus nos faz proclamar
silenciosamente:
“Meu Deus, me dá cinco anos, me dá a mão, me cura de ser grande...”
(Adélia Prado).
É
a fragilidade de uma criança que ativa em nós a atitude da expectativa, da
novidade, do assombro... Cada nascimento é um sinal, um imenso milagre, uma
bela promessa, um profundo chamado. Viver é milagre. Só ser já é milagre. E o
maior milagre é a ternura que cuida, nutre, consola. Isso é “Deus”.
Dizia
o pintor Pablo Picasso que tornar-se criança leva tempo, e poderíamos
acrescentar que somente o encontro com o Deus Menino nos devolve a pureza e a
inocência primordiais. Quando nos fazemos presentes junto à Criança eterna,
então brota em nós o impulso para a renovação de vida, o despertar da inocência
escondida, o encontro com novas possibilidades de ação que correm em direção ao
futuro.
O
Natal é essa ternura que ilumina a história humana, o cosmos do qual somos
parte. É a confissão de que a bondade gera e sustenta a vida. É crer que tudo
está eternamente movido por um pulsar profundo, criador, maior e mais poderoso
que o universo, mais terno e pequeno que o coração de um recém-nascido. É a
promessa de que o bem prevalecerá.
Ao
recuperar o olhar de assombro e de espanto no interior da Gruta de Belém, nossa
mente se abre à imaginação e ao sonho, começamos a considerar as infinitas
possibilidades para ser e conviver, brota a alegria do novo, do que está
nascendo a cada instante, de explorar recursos inéditos e desconhecidos.
Natal
é o tempo para acolher com ternura o que é germinal, o pequeno, o que nasce nos
movimentos sociais e humanitários alternativos e nos grupos eclesiais que se
empenham por um mundo novo e por uma Igreja mais sintonizada com o sonho de
Deus. É o momento de sair para os excluídos, para aqueles que não podem chegar
até nós.
Ao
entrar na gruta para contemplar o Menino-Deus, conectamos, ao mesmo tempo, com
o mais profundo do coração humano, carregado de compaixão e generosidade. A bondade
humana é uma faísca que pode se atrofiar, mas jamais se apagar. São necessários
alguns momentos densos para que esta chama seja ativada. A vivência do Natal é
um deles.
Da
“Gruta de Belém” à “gruta interior”: esta é a aventura que nos leva a crescer,
amar e compartilhar com os outros o dom da vida; aprender a ver nas pessoas a
grande reserva de bondade, altruísmo e generosidade que carregam dentro de si;
nunca conformar-nos com a injustiça e a violência, semeando cordialidade e
gentileza a todos (as); e, sobretudo, ser mestres da esperança. “...porque é
de infância, meu filho, que o mundo precisa” (Thiago de Mello).
O
Menino Deus, em Belém, nos oferece uma maneira nova de olhar a realidade e a
fragilidade de tantas pessoas. A contemplação de Jesus em seu nascimento nos
ensina a contemplar a fragilidade e a exclusão humana como uma forma de
presença de Deus. Deus está entre nós como fragilidade, nos excluídos, nos
pobres, nas carências de todo tipo, em cada uma de nossas limitações. Por isso
mesmo, sair, descer ao encontro das carências humanas, é uma forma de
peregrinação para o coração do Deus mais vivo e surpreendente. Com os mesmos
passos com que nos aproximamos da fragilidade dos que sofrem, também nos
aproximamos de Deus.
A
partir dessa debilidade podemos sentir que passa por nós a força de Deus, seu
santo braço, que transforma, com nossa ajuda, toda a realidade. Se Deus
correu o risco de encarnar-se, de nascer pobremente e crescer como salvação a
partir da exclusão deste mundo, já não há excluídos para Ele, ninguém fica fora
d’Ele. E o lugar principal para a festa é ali onde Ele aparece: nos aforas,
onde não há lugar, onde tudo parece esgotar-se e é condenado a crescer em meio
às ameaças e às intempéries das situações humanas.
O
Nascimento de Jesus é um atrevimento, uma verdadeira ousadia, uma surpresa
inimaginável...; na verdade, o Natal é a manifestação do impossível que se faz
possível no coração de Deus.
“Ele
é o eterno Menino, o Deus que faltava; o divino que sorri e que brinca; o
menino tão humano que é divino” (Fernando Pessoa).
Agora
temos um Deus menino e não um Deus juiz severo de nossos atos e da história
humana. Quê alegria interior sentimos quando pensamos que seremos julgados por
um Deus Menino! Ao invés de condenar-nos, ele quer conviver e entreter-se
conosco eternamente.
Texto
bíblico: Lc 2,1-14
Na
oração:
Que saibamos escutar a nossa criança interior que clama por ser amada,
acolhida, curada de tanta mesquinhez, intolerância, e indiferença.
O
Natal é como um poema; nele Deus se revela como uma Criança, pois nos mostra
que a vida é sempre dom, novidade que destrava a humanidade para expandi-la por
inteira. Que o Deus Menino que vai nascer nos mostre o caminho da verdadeira
beleza da vida, e a graça de nunca perdermos a alegria de ser e viver.
Deus
seja louvado!
Um
abençoado Natal a todos!
Pe.
Adroaldo Palaoro sj""Retirado do site - CATEQUESE Hoje- http://www.catequesehoje.org.br "- Um site com brasileiro com muita qualidade!
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