“…e viu que a pedra tinha sido tirada do túmulo”
(Jo 20,1)
"O sentido do Evangelho do domingo de Páscoa é de uma
riqueza extraordinária; ele começa realçando um amanhecer cheio de contrastes:
escuridão, ida ao sepulcro, a pedra rolada, pôr-se a correr. Desconcerto. Ele
não está. Quem O levou? Onde o colocaram?
Quando começa o amanhecer, a escuridão vai se
dissipando. Mas ainda não se veem as coisas claramente. O coração anseia ver e
encontrar. As sombras impedem ver; o sepulcro impede ver; as faixas impedem
ver; as pressas impedem ver. Correm as mulheres; corre Simão Pedro; corre
João.
No final, encontrar-se-ão com Ele quando estiverem
quietos, a sós consigo mesmos. Não é correndo que se experimenta a Páscoa; é
na espera silenciosa que se encontra com o Ressuscitado. Pois é Ele quem toma a
iniciativa, se apresenta e se dá a conhecer. Luminosa, amorosa,
pacificadora, vibrante, feliz, generosa, reconciliadora..., assim é a presença
do Ressuscitado entre seus amigos e amigas.
Não encontraremos o Ressuscitado no sepulcro, mas na
vida. Não encontraremos o Ressuscitado enfaixado e paralisado pela morte. Só
poderemos encontrar o Ressuscitado livre como a brisa da vida.
Não “vemos” a Ressurreição contemplando os restos da
morte; só podemos contemplar o Ressuscitado no mistério da vida. Pois só existe
a Vida. E “Jesus ressuscitou de tanto viver”. Aquele que viveu tão
intensamente não podia permanecer na morte. Por isso, só no compromisso com a
vida é que podemos encontrá-Lo. A Ressurreição nos revela: só existe a Vida; só
nos resta viver intensamente.
O relato do Evangelho do domingo de Páscoa é uma
verdadeira catequese: para quem viveu a experiência, trata-se do “primeiro dia
da semana”; para Maria Madalena, no entanto, ainda é de noite: “está escuro”.
Sabemos que para o autor do 4º. Evangelho, a noite é sinônimo de obscuridade,
confusão, ignorância; o “primeiro dia”, pelo contrário, faz alusão à “nova
criação”.
Madalena levanta-se de madrugada, quando ainda está
escuro; a dor por aquele que ama faz vencer o medo, coloca-a em movimento e
põe-se a buscar . Não se resigna diante da ausência do seu amado, nem diante da
ideia do fracasso e da morte.
Marida Madalena é boa companheira quando atravessamos
circunstâncias de “vida sepultada”, quando não sabemos o que fazer diante da
dor dos outros, quando estamos próximos de pessoas que vivem realidades de
desesperança, de não ver saída, de “pedras” que vão sendo colocadas encima e
deixam a vida paralisada; quando já estamos tentados a dizer: "não há nada
que fazer”, “as coisas não vão mudar”.
Ao caminhar em direção ao sepulcro, lugar da morte e
da desesperança, Maria Madalena é surpreendida ao observar que “a pedra tinha
sido removida”, ou seja, que a morte tinha sido vencida. Ela busca
desesperadamente um corpo sem vida; enquanto assim busca não poderá reconhecer
Jesus. Ele já não está onde não há vida, porque onde Ele aparece toda vida se
levanta. Se Ele está no centro, há vida até no fundo dos sepulcros.
“A pedra tinha sido removida”: imagem instigante e que
nos sugere algo profundamente sábio: debaixo de cada “pedra” que parece
amassar-nos, há vida que quer ressuscitar. Mais profundamente ainda, não há
nenhuma “pedra”, nada que seja capaz de sufocar a vida. Qualquer “pedra” que
nossa mente possa imaginar já foi “afastada”: o que somos, encontra-se sempre a
salvo; a vida não pode ser derrotada.
Depois de ficar impactada diante do túmulo aberto, ela
volta correndo à cidade para contar isso aos outros; é a primeira corrida de
Maria Madalena. Dois homens correm também para o sepulcro: um vê mas não entra,
o outro entra e a princípio ainda não vê. Estão embaçados os seus olhos, é
lenta a visão que busca um corpo conhecido, que pensa encontrar o já sabido, o
já visto, o já esperado.
No final da corrida, uma tumba vazia, algumas faixas,
um sudário e um vazio no coração. Pedro e João regressam pensativos ao refúgio,
onde se encontram os outros discípulos. O sepulcro vazio é um convite a
saber olhar com o coração para poder descobrir, nas “faixas” e no “sudário” de
nossa vida, o Ressuscitado, a Presença d’Aquele que É.
Ao chegarem ao sepulcro, Pedro e João não viram o
Ressuscitado, mas “faixas” e “sudário”. Mas, tanto as faixas como o sudário não
são elementos que por si mesmos fundamentam a fé na ressurreição. Requer-se uma
maneira de “olhar” que vai mais além da materialidade, ou melhor, que saiba
descobrir nos sinais a Presença d´Aquele que está presente em tudo e tudo
anima. Quem sabe “olhar” desse modo é “o outro discípulo, a quem Jesus amava”,
a imagem do verdadeiro discípulo.
Sem dúvida só o amor nos capacita para um olhar
contemplativo; por isso, o amor “corre” mais depressa que a autoridade. Vem à memória
palavras como as de Pascal: “O coração tem razões que a razão desconhece”; ou
as do Pequeno Príncipe: “O essencial é invisível aos olhos; só se vê bem com o
coração”.
É que o amor, por seu próprio dinamismo integrador e
unificador, nos faz descobrir a dimensão mais profunda da realidade que, de
outro modo, nos escapa. Para quem tem olhar contemplativo, as “faixas” já
representam um grande sinal: apontam para uma Vida destravada e plena.
“Faixas” são todo desejo de superação, a vontade que
sentimos de ser melhores, a aspiração por viver, o amor aos outros e a
capacidade de perdão; o desejo de plenitude; a beleza daquilo que nos cerca; a
vivência prazerosa, a esperança sustentada em meio ao sofrimento; o silêncio; a
vivência do Presente; a oração; o encontro pessoal; a experiência de ser
transformados; a mesa compartilhada...
À luz da Ressurreição, tudo isso ganha dinamismo e um
novo impulso para viver em
plenitude.
Diante da obscuridade daqueles que ainda não
experimentaram o encontro com o Ressuscitado, as testemunhas proclamam: “Jesus
ressuscitou” e “viver como ressuscitados” é a marca que identifica os(as)
seguidores(as) d’Aquele que “ressuscitou de tanto viver”.
E essa é a Boa notícia que nada nem ninguém poderá
arrebatar-nos. A Ressurreição não é simplesmente para ser contada, é para
ser vivida; ou dito de outra maneira, não podemos contá-la sem ter ficado
transformados, sem ter sido transpassados por essa experiência que rompe as
fronteiras de nossa vida.
Texto bíblico: Jo 20,1-9
Na oração: São nossas pequenas
ressurreições cotidianas que falam da Ressurreição de Jesus; nas nossas
ressurreições descobrimos a presença do Ressuscitado. É em nossa vida onde O
reconhecemos vivo. Somos testemunhas de sua ressurreição; somos testemunhas da
nova vida; somos testemunhas do novo que está começando. Páscoa, luz expansiva
que nos faz perceber em profundidade os sinais de Vida.
- Rezar as “faixas” e o “sudário” do seu cotidiano que
apontam para a Vida plena.
A todos aqueles(as) que hoje amanhecem “novos”,
“criaturas novas”, uma Santa Páscoa.
Pe. Adroaldo Palaoro sj "
"Retirado do site -CATEQUESE Hoje- http://www.catequesehoje.org.br "- Um site com brasileiro com muita qualidade!
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