segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Vocação de José

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(…) “Vocação de José

UMA PALAVRA PARA TODOS

São José é a figura-chave para compreender algumas das dimensões essências da vocação cristã. Eis quatro delas: proteger a vida, praticar a justiça, deixar que Deus seja o protagonista da nossa vida, cultivar a dimensão mística [Mateus1, 18-25; 2, 1-23].

No coração da Quaresma, a 19 de Março, a Igreja celebra a festa de São José. Como a de Maria no período do Advento [8 de Dezembro, festa da Imaculada Conceição]. Representado frequentemente como um venerado ancião de barbas e cabelos brancos, de olhar triste e distante, de semblante preocupado, curvado sob o peso do seu destino…dir-se-ia que espelha o humor de um certo «espírito quaresmal» de outros tempos!

Os valores que o caracterizam, silêncio, obediência e serviço, também não estão na moda. Não é de admirar pois que a devoção a este santo tenha vindo a declinar desde há certo tempo. E isto não obstante a exortação apostólica de João Paulo II Redemptoris Custos, de 1989, considerada a «magna carta» da teologia de São José.

De todas as maneiras, São José é figura-chave para compreender algumas  das dimensões essenciais da vocação cristã. Eis quatro delas: proteger a vida, praticar a justiça, deixar que Deus seja o protagonista da nossa vida, cultivar a dimensão mística. 

Servidor da Vida

Modelo de PATERNIDADE-Em hebraico, o nome José significa «Deus acrescente», «Deus te aumente». Uma vocação à fecundidade, à sobreabundância de vida, por conseguinte!

Descendente de David[«filho de David»], originário de Nazaré, «carpinteiro» [tékton], uma profissão ligada à construção. Nos evangelhos é apresentado, por vezes, como o «esposo de Maria», coisa insólita porque geralmente era a esposa que pertencia ao marido. Mas também se diz  de Maria que era «esposa de José» [Mateus 13,55].

José antecipa e vive a palavra de Jesus que «um só é nosso Pai» [Mateus 23,9]. Encarna de uma maneira singular esta única paternidade divina [cf. Efésios 3,15]. É pai sem exercer a paternidade carnal. Mas é pai para todos os efeitos, porque «ser pai é antes de mais ser servidor da vida e do seu crescimento» [Papa Bento XVI].

Como os antigos patriarcas, também ele recebe as comunicações de Deus através de sonhos, por três vezes. Sinal de uma vocação singular e de uma particular relação com Deus.

José é o último dos antigos patriarcas, mas o primeiro de uma nova geração, daqueles que «não nasceram do sangue, nem do impulso da carne, nem do desejo do homem, mas nasceram de Deus» [João1, 13].

Esta «paternidade» é uma dimensão da vocação cristã. Somos chamados, como José, a adoptar e proteger a vida. Ser fecundos, viver ao serviço da vida, sem apossar-se dela, desprendidos. José nos ensina como se pode amar sem «possuir» as pessoas.

A paternidade/maternidade é um valor que urge descobrir hoje, numa sociedade de « vagabundagem de experiências», rica em «filhos pródigos» mas pobre de «pais» e «mães» capazes de esperar pacientemente em casa para abraçar tais filhos quando eles regressarem, desiludidos da vida e famintos de amor. Tantas vezes encontram a casa vazia, sem ninguém à espera deles!...

Saber «ajustar-se»

Modelo de JUSTIÇA - O Evangelho define José um «homem justo» [Mateus1,19]. Justo porque, sendo «fiel», «ajusta» a sua vida de acordo com a Palavra do seu Senhor. Mas também porque, sendo «sábio», é capaz de «ajustar-se» à realidade. Com efeito, quando se dá conta que Maria está grávida, sua primeira reacção é de cumprir a Lei [repudiando Maria], mas decide fazê-lo em segredo. Introduz assim um elemento novo, de prudência e sabedoria. Mantém a sua confiança em Maria. Não se deixa levar pela sua «suspeita». Porquê? Porque há nele «uma longa frequentação de uma outra palavra que o toca e penetra» [Frédérique Oltra, carmelita].

Sendo «justo», ele é o «administrador sábio e fiel que o Senhor coloca à frente do pessoal de sua casa» [Lucas 12,42]. José sabe que é «servo» e que deve servir bem. Não basta a boa vontade. Por isso o texto bíblico fala de um homem «sábio e fiel» [Mateus 24,45]. «A inteligência sem fidelidade e a fidelidade sem inteligência são insuficientes» para assumir a responsabilidade que Deus nos confia [BentoXVI].

Praticar a justiça faz parte da nossa vocação. Ser «justos», como José. Uma justiça que nos leva a adoptar um comportamento «justo» e a ocupar o lugar «justo» na vida, o do serviço. Uma justiça iluminada pelo amor, «o cumprimento perfeito da Lei» [Romanos 13, 10]. Um bem que também escasseia hoje. Fala-se muito de justiça, mas faltam «homens justos».

Ficar fora da fotografia

Modelo de DISCRIÇÃO -José é um homem discreto, uma pessoa reservada. Sempre «fora da fotografia», como comenta, com certa graça, um autor: «Duas irmãs folheavam o novo livro de religião, quando vêem uma pintura da Virgem Maria com o Menino Jesus.- Olha- diz a maior-, este é Jesus, e esta é sua mãe. –E onde está o pai?- pergunta a mais pequenina. A irmã pensou por um momento e então exclamou: - Ah, ele tira a fotografia.»

Homem do silêncio, os factos falam por si. Homem da obediência, o Evangelho sublinha o perfeito cumprimento das disposições que lhe são comunicadas pelo anjo em sonho[Mateus 1,24]. Como diz o Cântico dos Cânticos: enquanto dorme, o seu coração permanece vigilante [5,2].

Esquecido de si mesmo, vive para «o menino e sua mãe» [Mateus 2,13.19]. Como João Baptista, considera que é bom que ele mesmo diminua e que eles cresçam. A sua vida pertence-lhes totalmente. E assim, a certo ponto «desaparece» …para não fazer sombra ao filho!

Cada um de nós é chamado a seguir este testemunho. Discretos como José, pondo a nossa vida ao serviço da missão de Cristo. Saber pôr-se de lado, retirar-se atrás dos bastidores. Não é coisa fácil nem evidente. Vivemos numa sociedade que privilegia a «realização pessoal» e o protagonismo. Desde pequenos, concebemos o nosso próprio projecto de vida, o que queremos ser «quando formos grandes». A vocação implica renunciar a tal sonho humano [como José com Maria] para abraçar o divino. Saber eclipsar-se para que o projecto de Deus se realize em nós!

Habitar o mistério

Modelo de CONTEMPLAÇÃO -José é o santo do silêncio, um que não fala nunca. Mas um silêncio rico e profundo, que nos desafia. Porquê este silêncio? Porque José vive o mistério! Não se trata de uma questão de palavras, mas de atitude de vida, de toda a sua pessoa.

Diante do facto inesperado - para ele incompreensível e «misterioso» - de Maria grávida, José pensa em retirar-se, silenciosamente. É  a palavra do anjo: «não tenhas medo de receber Maria como esposa, porque ela concebeu pela acção do Espírito Santo» [Mateus 1,20] que introduz José no mistério, como Gabriel fizera a Maria.

Esta palavra não elimina o mistério , não explica o que realmente aconteceu, nem como. Esta palavra introduz José no mistério que já absorvera Maria. José não está mais na frente do mistério mas dentro. «Não é como o povo de Israel em frente da nuvem no deserto, entra dentro da nuvem, como Moisés ou como os três apóstolos no monte Tabor» [teólogo Borel].

Antes estava «fora» do mistério, de frente a ele, e por isso duvidava e tinha medo. Depois deixa-se conduzir por ele, como Maria após o seu «fiat». «Agora», dentro «do mistério, mesmo sem compreendê-lo, não o pode negar.

Entrar» no mistério de Deus é dimensão essencial de toda a vocação. Esta requer a disponibilidade de a deixar-se «introduzir» nele. Sem isso, o vocacionado fica «de fora» e não encontrará as motivações para viver à altura da sua vocação. Será, na melhor das hipóteses, um «bom funcionário» ou um «mercenário», e no pior dos casos um «parasitário» ou «servo infiel» [Lucas 12,46].

Em conclusão, José não é certamente o homem retratado por uma certa iconografia. Envolvido pelo mistério, no seio de uma família que amou e amava, identificado com a sua vocação de protector do Autor da Vida, exercendo com competência a sua profissão…E foi um homem feliz!”(…)

“Retirado do Livro- “o mestre está cá e chama-te!-Vocação na Bíblia-Além Mar” do Pe. Manuel João P. Correia, mccj "

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