(…)«Certos homens da Igreja, encerrados nos esquemas e não querendo ver por trás das palavras a realidade terrível, desnuda e bela, deixaram de perceber esse rumor imenso. Uma Igreja institucional encerrada nos grossos muros dos palácios episcopais e romanos deixou de ouvir a poderosa voz do mundo, a gigantesca voz de Deus».(…)
(…) “Raízes da incapacidade de
renovação – Onde está a raiz de uma situação tão contrária à natureza
do cristianismo? Sem dúvida , no facto
de que a Igreja não se renova. E não o faz, em primeiro lugar, porque parece
faltar-lhe o Espírito, que é a fonte da sua renovação. Porque a Igreja vive para tornar presente Jesus Cristo, que é
«ontem, hoje e para sempre» (Heb 13,8). Mas a verdade é que muitas das suas
estruturas, em vez de presencializar, ocultam Jesus Cristo e o seu Espírito(…)
A Igreja actual não se renova, porque
está falhando nela o relevo geracional que origina a crise na transmissão da
fé, e falta-lhe a renovação que procura o contacto com os outros, os
diferentes, que lhe procuraria uma bem entendida evangelização(…)”
(…) “Causas das dificuldades para a
transmissão no nosso próprio interior- (…) Talvez tenhamos que
reconhecer que as nossas comunidades não transmitem porque não têm que
transmitir, ou melhor dizendo, porque não somos de verdade cristãos, não
vivemos como tal, não constituímos a semente, a
levedura, a luz, o sal que o Evangelho nos convida a ser, e que, na
medida em que o são, pelo único facto de ser, germinam, fermentam, iluminam e
amadurecem. Isto é, que talvez a falta de
renovação geracional que o cristianismo sofre se deva, em boa medida, à falta
de renovação interior, espiritual: a renovação, procedente do Espírito de Deus,
das gerações encarregadas pela
transmissão.(…)
… “Não é verdade que o nosso
ideal se limitou a conservar a fé, a não a perder, sem nos propormos - ou pelo menos sem o conseguir - encarná-la na
nossa vida, inculturá-la, como se diz agora, no momento histórico que nos tocou
viver? Não é verdade que a pastoral da qual nós fomos «objecto», e a que
nós próprios realizámos, foi sobretudo
uma pastoral de «conservação», de «manutenção», que reproduzia a atitude do
servo da parábola que recebe o denário e
o enterra debaixo das camadas pesadas da rotina, costumes, tradições,
conformismo, por medo de o perder? Um cristianismo assim não pode ser
transmitido, porque é uma semente caduca, que pôde ter vigência noutro tempo,
mas que há muito a perdeu.(…)
(…) As comunidades cristãs, sujeito
primeiro de transmissão-(..) Ora bem, as comunidades cristãs estão chamadas
a ser contextos vitais nos quais as pessoas partilham essa nova forma de vida.
Esta comporta dois elementos fundamentais: a conversão que origina adesão pessoal
da fé e o seguimento no qual se assume a forma de vida de Jesus em quem Deus se
revelou pessoalmente e a quem o próprio Deus ratificou na sua ressurreição. A
comunidade é assim lugar da «verificação» e a ratificação pessoal e social do
cristianismo como nova forma de vida(…).
… Para chegar a ser o que está chamada a ser, a comunidade não
pode constituir um mundo artificial e isolado do mundo em que decorre a vida real
das pessoas e a história da humanidade. «Fora do mundo não há salvação»
(Schillebeeckx);” (…)
… A chave para que esta possa
realizar-se «é o testemunho das
comunidades que nasce do humilde esforço de muitos por realizar, ainda que de forma deficiente e imperfeita, uma
vida diária impregnada pelo espírito
cristão…A partir deste contexto experiência, o cristianismo tem a possibilidade
de interessar de novo pais e filhos, mestres e alunos».”(…)
(…) Uns poucos conselhos «em voz
baixa»- (…) “ “Deus”, sem a
virtude, é uma palavra vazia, disse um filósofo pagão e místico. «Deus» e todas
as palavras cristãs são palavras ocas, carecem de significado, até que a
prática, a vida de quem as pronuncia, começa a torná-las realidade. A primeira
coisa que uma família, um centro educativo ou uma comunidade têm que fazer para
transmitir a fé é viver a fé cristã.(…)
…Eu estou seguro de que todos
conhecemos pessoas e grupos cristãos sem especiais atributos, inclusive sem
nome, cuja maneira de viver está tornando presente Deus e o seu amor e difunde
assim o bom aroma de Cristo, torna mais crível o nome cristão e, desse modo,
colabora na transmissão no nosso tempo do cristianismo. Oxalá, cada um de nós
seja um deles!”
-Juan Martín Velasco é Director do Instituto Superior de Pastoral da Universidade Pontífica de Salamanca em Madrid. Trabalha também com a Comunidade da Paróquia de São Paulo (Vallecas, Madrid). É ainda autor de numerosos livros e artigos com grande projecção nas comunidades eclesiais.
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