(...) “Vocação de João Baptista
UMA VOCAÇÃO COM CINCO MORADAS
João Baptista é a ponte que das margens da Primeira ou da
Antiga Aliança conduz à nova terra prometida, ao templo da Nova aliança,
realização das antigas promessas. Ele é «o profeta do Altíssimo… enviado
adiante do Senhor a preparar os seus caminhos (Lc1,68.76.79). Ele proclama-se a
«Voz»(Mt 3,2), «o Amigo do Esposo» (Jo 3,29). Jesus tece-lhe o seguinte elogio:
«entre os nascidos de mulher não veio ao mundo outro maior que João
Baptista»(Mt 11,11. Ver ainda (Lc. 1,5-25 e 57-80; Mt 3, 1-17).
Uma tal missão corresponde a uma vocação especialíssima. Mas
também exemplar, que ilumina a nossa própria vocação. Vamos descrevê-la em cinco etapas, tendo como
referência cinco lugares a ela ligados: O Templo, a casa, o deserto, o rio
Jordão e a prisão do palácio Herodes.
O TEMPLO de Deus,
Onde a vida e a
vocação são concebidas
«Ora, exercendo Zacarias diante de Deus as funções de
sacerdote, na ordem da sua classe, coube-lhe por sorte, segundo o costume em
uso entre os sacerdotes, entrar no santuário do Senhor e aí oferecer o perfume…
Apareceu-lhe um anjo do Senhor em pé, à direita do altar do perfume» (Lc, 1,
5-25).
A vocação de Baptista
começa no Templo de Jerusalém, com o anúncio da boa nova do nascimento trazida
por pelo anjo Gabriel ao assustado e incrédulo Zacarias: «Não temas Zacarias. Deus
ouviu a tua prece. Isabel, tua mulher, vai dar-te um filho, ao qual porás o nome de João.» João significa Deus é misericordioso.
Todos os nossos nomes aludem à sua Misericórdia!...
A vida tem início no «Templo», demora primordial do Ser.
Todos somos concebidos, em primeiro lugar, no Coração de Deus. De lá dimana a
vida, a eleição, a consagração e a missão do vocacionado: «Antes de te formar
no ventre de tua mãe, Eu te consagrei, para fazer de ti profeta das nações»(Jer.
1,5).
Uma vida que corte com este cordão umbilical que a liga à
fonte do Ser está condenada a perder vitalidade e a definhar; a perder-se nos
meandros de tantos atalhos tortuosos da existência; a vaguear na obscuridade
das muitas noites sem estrelas. Uma vocação que não cultiva a comunhão com Deus
na oração, que não frequenta o seu templo interior, depressa será sufocada por
mil vozes vociferantes, por ilusões e fantasias, por espinhos e abrolhos.
Há um templo de Deus a ser reconstruído - antes de mais em
nós- diz o profeta Ageu: «É então o momento de habitardes em casas
confortáveis, estando esta casa em ruínas? Eis o que declara o Senhor dos exércitos:
considerai o que fazeis! Semeais muito e recolheis pouco; comeis e não vos
saciais; bebeis e não chegais a apagar a vossa sede; vestis, mas não vos
aqueceis; e o operário guarda o seu salário em saco roto!...Porquê? Porque a
minha casa está em ruínas, enquanto cada um de vós só tem cuidado com a
sua»(Ageu 1).
A CASA, lugar de gestação da vida e vocação
«Decorridos os dias do seu ministério, (Zacarias) retirou-se
para sua casa. Depois disso, Isabel, sua mulher, engravidou e durante cinco
meses não saiu de casa»(Lc.1, 23-24).
A vida, com toda a sua extraordinária beleza, força e exuberância,
capaz de maravilhar-nos a cada passo, é também extremamente frágil. Necessita
de ser acolhida no seio da Terra, de encontrar uma casa onde habitar, de ser
hospedada num ventre que a nutre, acarinha e protege…
A vida nascente e a vocação de profetizada de João Baptista
encontraram na casa de Zacarias e no seio de Isabel um berço acolhedor.
Da mesma maneira toda a vocação requer uma «casa», um
contexto favorável. Tal «casa» será a família, a comunidade cristã, um grupo de
apoio…Ou seja, uma espécie de «estufa» que ofereça as condições necessárias à sua
nascença e crescimento. Uma vocação especial, com efeito, é uma planta rara que
requer condições ambientais particulares. Como aquelas descritas pelo salmo
128: «Bem-aventurado aquele que teme o Senhor e anda nos seus caminhos. Pois
comerás do trabalho das tuas mãos, serás feliz e tudo te irá bem. A tua mulher
será como a videira frutífera aos lados da tua casa; os teus filhos como
plantas de oliveira à roda da tua mesa. Eis que assim será abençoado o homem
que teme o Senhor.»
O DESERTO, lugar de purificação
« O menino foi crescendo e fortificava-se em espírito, e
viveu nos desertos até o dia em que se apresentou diante de Israel»(Lc.1,80).
Não se pode viver eternamente numa estufa. A certa altura, a
planta deve interagir com o seu mundo exterior, com o ar, o vento, o sol, a
chuva…para poder crescer e desenvolver-se em todas as suas potencialidades.
Terá , por isso, de enfrentar as intempéries, de resistir aos rigores do
Inverno, de encarar o calor do estio…
João Baptista estabeleceu-se no deserto, porque ali encontra
um ambiente espiritual que o prepararia para a sua missão. No deserto faz a
experiência do profeta Elias e do povo de Israel durante a caminhada dos
quarenta anos do êxodo. Depende totalmente da providência de Deus, contentando-se daquilo
que oferece o deserto: gafanhotos e mel silvestre. Ali Deus lhe fala ao
coração(Oseias 2,14) e o prepara a tornar-se sua Voz.
Assim acontece com todos os chamados. Sem a prova do
deserto, da solidão, do silêncio, da austeridade, das dificuldades e das provas…não
haverá vocação provada. À mínima dificuldade o sol definha-a, os espinhos
sufocam-na.
Jesus não foi excepção. Com efeito, o evangelho de Lucas diz
«Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi levado pelo Espírito ao
deserto, onde, durante quarenta dias foi tentado pelo diabo. Não comeu nada
durante esses dias e, ao fim deles, teve fome» (Lc 4,1-2).
O RIO Jordão, lugar do apostolado e da missão
«Veio a palavra do Senhor no deserto a João, filho de
Zacarias. Ele percorria toda a região do
Jordão, pregando o baptismo de arrependimento para remissão dos pecados,
como está escrito no livro das palavras do profeta Isaías: Uma voz clama no
deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas»(Lc 3, 2-4).
O deserto é também uma etapa em função da missão do profeta.
João Baptista deixa o deserto para ir ao encontro das pessoas e levar-lhes a
mensagem de que fora incumbido. Estabelece-se agora junto do Jordão, na
fronteira entre o deserto e a terra. E o seu grito chega a todo lado. As
multidões acorrem ao Jordão para ali serem baptizadas. É como uma nova travessia
do rio bíblico para ingressar no Reino, conduzidos pelo novo Josué que será
Jesus, o Messias.
No rio Jordão, quando João Baptiza Jesus, corre já «o rio da
água da vida» dos últimos tempos: «Então o anjo me mostrou o rio da água da
vida que, claro como cristal, fluía do trono de Deus e do Cordeiro, no meio da
rua principal da cidade. De cada lado do rio estava a árvore da vida, que
frutifica doze vezes por ano, uma por mês. As folhas da árvore servem para a
cura das nações» (Ap. 22,1-2).
A PRISÃO, lugar do martírio e da fecundidade
«Naquele tempo, Herodes tinha mandado prender João e
acorrentá-lo na prisão…» (Mc. 6, 17-29).
Como para João Baptista, chega para todos também a etapa da
prisão e do martírio. Porque «é necessário que Ele cresça, e que eu diminua»(Jo.3,30).
É o momento supremo do testemunho do amor e da fecundidade
apostólica.
Os «Herodes» podem ser muito variados: uma doença, a
velhice, a perseguição, o fracasso…É importante aceitar «ser-se posto na
prisão» e fazer entrar a luz do mistério pascal na nossa prisão.
Comboni dizia dos seus missionários que deveriam ser «pedras
escondidas», enterradas no solo africano…É a condição indispensável para ser
alicerce da construção que se erguerá
sobre nós. Será então que a nossa vida e a nossa vocação serão verdadeiramente
fecundas, como diz Jesus: «Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele
fica só. Mas, se morre, produz muito fruto»(Jo. 12,24)." (…)
“Retirado do Livro- “o
mestre está cá e chama-te!-Vocação na Bíblia-Além Mar” do Pe. Manuel João P.
Correia, mccj "
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