sexta-feira, 27 de janeiro de 2023
Corações ardentes, pés ao caminho (cf. Lc 24, 13-15)
[22 de outubro de 2023]
Corações ardentes, pés ao caminho (cf. Lc 24, 13-15)
Queridos irmãos e irmãs!
Para o Dia Mundial das Missões
deste ano escolhi um tema que se inspira na história dos discípulos de Emaús,
narrada por Lucas no seu Evangelho (cf. 24, 13-35): «Corações ardentes, pés ao
caminho». Aqueles dois discípulos estavam confusos e desiludidos, mas o
encontro com Cristo na Palavra e no Pão partido acendeu neles o entusiasmo para
pôr os pés ao caminho rumo a Jerusalém e anunciar que o Senhor tinha
verdadeiramente ressuscitado. Na narração evangélica, apreendemos a
transformação dos discípulos a partir de algumas imagens sugestivas: corações
ardentes pelas Escrituras explicadas por Jesus, olhos abertos para
O reconhecer e, como ponto culminante, pés ao caminho. Meditando
sobre estes três aspetos, que traçam o itinerário dos discípulos missionários,
podemos renovar o nosso zelo pela evangelização no mundo de hoje.
1. Corações ardentes, «quando
nos explicava as Escrituras». A Palavra de Deus ilumina e transforma o coração
na missão.
No caminho de Jerusalém para Emaús,
os corações dos dois discípulos estavam tristes – como transparecia dos seus
rostos – por causa da morte de Jesus, em Quem haviam acreditado (cf. 24, 17).
Perante o fracasso do Mestre crucificado, a esperança de que fosse Ele o
Messias, desmoronou-se neles (cf. 24, 21).
E eis que, «enquanto conversavam e
discutiam, aproximou-Se deles o próprio Jesus e pôs-Se com eles a caminho» (24,
15). Como no início da vocação dos discípulos, também agora, no momento da
frustração, o Senhor toma a iniciativa de Se aproximar dos seus discípulos e
caminhar a par deles. Na sua grande misericórdia, Ele nunca Se cansa de estar
connosco, apesar dos nossos defeitos, dúvidas, fraquezas e não obstante a
tristeza e o pessimismo nos reduzam a «homens sem inteligência e lentos de espírito»
(24, 25), pessoas de pouca fé.
Hoje como então, o Senhor
ressuscitado está próximo dos seus discípulos missionários e caminha a par
deles, sobretudo quando se sentem frustrados, desanimados, temerosos perante o
mistério da iniquidade que os rodeia e quer sufocá-los. Por isso, «não deixemos
que nos roubem a esperança!» (Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium, 86). O Senhor é maior
do que os nossos problemas, sobretudo quando os encontramos ao anunciar o
Evangelho ao mundo, porque esta missão, afinal, é d’Ele e nós somos
simplesmente os seus humildes colaboradores, «servos inúteis» (cf. Lc 17,
10).
Em Cristo, expresso a minha
proximidade a todos os missionários e missionárias do mundo, especialmente
àqueles que atravessam um momento difícil: caríssimos, o Senhor ressuscitado
está sempre convosco e vê a vossa generosidade e os vossos sacrifícios em prol
da missão evangelizadora em lugares distantes. Nem todos os dias da vida são
cheios de sol, mas lembremo-nos sempre das palavras do Senhor Jesus aos seus
amigos, antes da Paixão: «No mundo, tereis tribulações; mas tende confiança: Eu
já venci o mundo!» (Jo 16, 33).
Depois de ouvir os dois discípulos
no caminho de Emaús, Jesus ressuscitado, «começando por Moisés e seguindo por
todos os profetas, explicou-lhes, em todas as Escrituras, tudo o que Lhe dizia
respeito» (Lc 24, 27). E os corações dos discípulos inflamaram-se,
como no fim haviam de confidenciar um ao outro: «Não nos ardia o coração,
quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?» (24, 32). Na
realidade, Jesus é a Palavra viva, a única que pode fazer arder, iluminar e
transformar o coração.
Assim compreendemos melhor a
afirmação de São Jerónimo: «A ignorância das Escrituras é ignorância de Cristo»
(Commentarii in Isaiam, Prologus). «Sem o Senhor que nos introduz na
Sagrada Escritura, é impossível compreendê-la em profundidade; mas é verdade
também o contrário, ou seja, que, sem a Sagrada Escritura, permanecem
indecifráveis os acontecimentos da missão de Jesus e da sua Igreja no mundo»
(Francisco, Carta ap. sob forma de Motu Proprio Aperuit illis, 1). Por isso, o
conhecimento da Escritura é importante para a vida do cristão e, mais ainda,
para o anúncio de Cristo e do seu Evangelho. Caso contrário, que iríamos
transmitir aos outros senão as próprias ideias e projetos? E poderia alguma vez
um coração frio fazer arder o dos outros?
Portanto, deixemo-nos sempre
acompanhar pelo Senhor ressuscitado que nos explica o sentido das Escrituras.
Deixemos que Ele faça arder o nosso coração, nos ilumine e transforme, para
podermos anunciar ao mundo o seu mistério de salvação com a força e a sabedoria
que vêm do seu Espírito.
2. Olhos que «se abriram e
O reconheceram» ao partir o pão. Jesus na Eucaristia é ápice e fonte da missão.
Os corações ardentes pela Palavra
de Deus impeliram os discípulos de Emaús a pedir ao misterioso Viandante que
ficasse com eles ao cair da noite. E, encontrando-se ao redor da mesa, os seus
olhos abriram-se e reconheceram-No, quando Ele partiu o pão. O elemento
decisivo que abre os olhos dos discípulos é a sequência de ações efetuadas por
Jesus: tomou o pão, pronunciou a bênção, partiu-o e deu-lho. São gestos comuns
de qualquer chefe de família judia, mas, realizados por Jesus Cristo com a
graça do Espírito Santo, renovam para os dois comensais o sinal da
multiplicação dos pães e sobretudo da Eucaristia, o sacramento do Sacrifício da
cruz. Mas, precisamente no momento em que reconhecem Jesus n’Aquele-que-parte-o-pão,
«Ele desapareceu da sua presença» (Lc 24, 31). Este facto faz
compreender uma realidade essencial da nossa fé: Cristo que parte o pão,
torna-Se agora o Pão partido, partilhado com os discípulos e depois consumido
por eles. Tornou-Se invisível, porque agora entrou dentro do coração dos
discípulos para fazê-los arder ainda mais, impelindo-os a retomar sem demora o
seu caminho para comunicar a todos a experiência única do encontro com o
Ressuscitado! Assim, Cristo ressuscitado é Aquele-que-parte-o-pão e,
simultaneamente, o Pão-partido-para-nós. E, por conseguinte, cada discípulo
missionário é chamado a tornar-se, como Jesus e n’Ele, graças à ação do
Espírito Santo, aquele-que-parte-o-pão e aquele-que-é-pão-partido para o mundo.
A propósito, é preciso ter
presente que, se o simples repartir o pão material com os famintos em nome de
Cristo já é um ato cristão missionário, quanto mais o será o repartir o Pão
eucarístico, que é o próprio Cristo? Trata-se da ação missionária por
excelência, porque a Eucaristia é fonte e ápice da vida e missão da Igreja.
Assim no-lo recordou o Papa Bento XVI: «Não podemos reservar para nós o
amor que celebramos neste sacramento [da Eucaristia]: por sua natureza, pede
para ser comunicado a todos. Aquilo de que o mundo tem necessidade é do amor de
Deus, é de encontrar Cristo e acreditar n’Ele. Por isso, a Eucaristia é fonte e
ápice não só da vida da Igreja, mas também da sua missão: uma Igreja
autenticamente eucarística é uma Igreja missionária» (Exort. ap.
pós-sinodal Sacramentum caritatis, 84).
Para dar fruto, devemos permanecer
unidos a Ele (cf. Jo 15, 4-9). E esta união realiza-se através
da oração quotidiana, particularmente na adoração, no permanecer em
silêncio diante do Senhor, que está connosco na Eucaristia. Cultivando
amorosamente esta comunhão com Cristo, o discípulo missionário pode tornar-se
um místico em ação. Que o nosso coração anele sempre pela companhia de Jesus, suspirando
conforme o ardente pedido dos dois de Emaús, sobretudo ao entardecer: «Fica
connosco, Senhor!» (cf. Lc 24, 29).
3. Pés ao caminho, com a alegria
de proclamar Cristo Ressuscitado. A eterna juventude duma Igreja sempre em
saída.
Depois de abrir os olhos ao
reconhecerem Jesus na fração do pão, os discípulos partiram sem demora e
voltaram para Jerusalém (cf. Lc 24, 33). Este sair apressado
para partilhar com os outros a alegria do encontro com o Senhor, mostra que «a
alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram
com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da
tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem
cessar a alegria» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 1). Não se pode
encontrar verdadeiramente Jesus ressuscitado, sem se inflamar no desejo de o
contar a todos. Por isso, o primeiro e principal recurso da missão são aqueles
que reconheceram Cristo ressuscitado, nas Escrituras e na Eucaristia, e que
trazem o seu fogo no coração e a sua luz no olhar. Eles podem testemunhar a
vida que não morre jamais, mesmo nas situações mais difíceis e nos momentos
mais escuros.
A imagem de pôr os «pés ao
caminho» recorda-nos mais uma vez a validade perene da missio ad gentes,
a missão confiada pelo Senhor ressuscitado à Igreja: evangelizar toda a pessoa
e todos os povos até aos confins da terra. Hoje, mais do que nunca, a
humanidade, ferida por tantas injustiças, divisões e guerras, precisa da Boa
Nova da paz e da salvação em Cristo. Por isso, aproveito esta ocasião para
reiterar que «todos têm o direito de receber o Evangelho. Os cristãos têm o
dever de o anunciar sem excluir ninguém, e não como quem impõe uma nova
obrigação, mas como quem partilha uma alegria, indica um horizonte estupendo,
oferece um banquete apetecível» (Ibid., 14). A conversão missionária
permanece o principal objetivo que nos devemos propor como indivíduos e como
comunidade, porque «a ação missionária é o paradigma de toda a obra da Igreja»
(Ibid., 15).
Como afirma o apóstolo Paulo, o
amor de Cristo conquista-nos e impele-nos (cf. 2 Cor 5, 14).
Trata-se aqui do duplo amor: o de Cristo por nós que apela, inspira e suscita o
nosso amor por Ele. E é este amor que torna sempre jovem a Igreja em saída, com
todos os seus membros em missão para anunciar o Evangelho de Cristo,
convencidos de que «Ele morreu por todos, a fim de que, os que vivem, não vivam
mais para si mesmos, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou» (2
Cor 5, 15). Todos podem contribuir para este movimento missionário:
com a oração e a ação, com ofertas de dinheiro e de sofrimento, com o próprio
testemunho. As Pontifícias Obras Missionárias são o instrumento privilegiado
para favorecer esta cooperação missionária a nível espiritual e material. Por
isso, a recolha de ofertas no Dia Mundial das Missões é destinada à Pontifícia
Obra da Propagação da Fé.
A urgência da ação missionária da
Igreja comporta naturalmente uma cooperação missionária, cada vez mais
estreita, de todos os seus membros a todos os níveis. Este é um objetivo
essencial do percurso sinodal que a Igreja está a realizar com as
palavras-chave comunhão, participação, missão. Seguramente tal
percurso não é um fechar-se da Igreja sobre si mesma; não é um processo de
sondagem popular para decidir, como num parlamento, o que é preciso, ou não,
acreditar e praticar segundo as preferências humanas. Pelo contrário, é pôr-se
a caminho como os discípulos de Emaús, escutando o Senhor ressuscitado que não
cessa de vir juntar-Se a nós para nos explicar o sentido das Escrituras e
partir o pão para nós, a fim de podermos levar avante, com a força do Espírito
Santo, a sua missão no mundo.
Assim como aqueles dois discípulos
narraram aos outros o que lhes tinha acontecido pelo caminho (cf. Lc 24,
35), assim também o nosso anúncio há de ser uma jubilosa narração de Cristo
Senhor, da sua vida, da sua paixão, morte e ressurreição, das maravilhas que o
seu amor realizou na nossa vida.
Portanto saiamos também nós,
iluminados pelo encontro com o Ressuscitado e animados pelo seu Espírito.
Saiamos com corações ardentes, olhos abertos, pés ao caminho, para fazer arder
outros corações com a Palavra de Deus, abrir outros olhos para Jesus
Eucaristia, e convidar todos a caminharem juntos pelo caminho da paz e da
salvação que Deus, em Cristo, deu à humanidade.
Santa Maria do Caminho, Mãe dos
discípulos missionários de Cristo e Rainha das missões, rogai por nós!
Roma – São João de Latrão, na
solenidade da Epifania do Senhor, 6 de janeiro de 2023.
FRANCISCO
Texto: Retirado do Site do Vaticano - http://www.vatican.va/ em 27/01/2023;
Imagem: Retirada da "Google imagens" em 27/01/2023;
domingo, 15 de janeiro de 2023
Eu não O conhecia... (Jo 1,31)
Catequeses - A paixão pela evangelização: o zelo apostólico do crente. O chamamento ao apostolado (Mt 9,9-13)
Hoje começamos um novo ciclo de catequeses, dedicado a um tema urgente e decisivo para a vida cristã: a paixão pela evangelização, ou seja, o zelo apostólico. Trata-se de uma dimensão vital para a Igreja: com efeito, a comunidade dos discípulos de Jesus nasce apostólica, nasce missionária, não proselitista e desde o início deveríamos distinguir isto: ser missionária, ser apostólica, evangelizar não é o mesmo que fazer proselitismo, nada tem a ver uma coisa com a outra. Trata-se de uma dimensão vital para a Igreja, a comunidade dos discípulos de Jesus nasce apostólica e missionária. O Espírito Santo plasma-a em saída - a Igreja em saída, que sai – para que não fique fechada em si mesma, mas seja extrovertida, testemunha contagiosa de Jesus - a fé também se contagia - destinada a irradiar a sua luz até aos extremos confins da terra. Contudo, pode acontecer que o ardor apostólico, o desejo de alcançar os outros com o bom anúncio do Evangelho, diminua, se torne tíbio. Às vezes parece eclipsar-se, são cristãos fechados, não pensam nos outros. Mas quando a vida cristã perde de vista o horizonte da evangelização, o horizonte do anúncio, adoece: fecha-se em si mesma, torna-se autorreferencial, atrofia-se. Sem zelo apostólico, a fé esmorece. Ao contrário, a missão é o oxigénio da vida cristã: tonifica-a e purifica-a. Então, empreendamos um caminho à redescoberta da paixão evangelizadora, começando pelas Escrituras e pelo ensinamento da Igreja, para haurir das fontes o zelo apostólico. Depois, abordaremos algumas nascentes vivas, algumas testemunhas que reacenderam na Igreja a paixão pelo Evangelho, a fim de que nos ajudem a reavivar o fogo que o Espírito Santo quer fazer arder sempre em nós.
E hoje, gostaria de iniciar com um episódio evangélico de certo modo emblemático, que acabámos de ouvir: o chamamento do apóstolo Mateus, e ele mesmo o narra no seu Evangelho, no excerto que ouvimos (Mt. 9, 9-13).
Tudo começa com Jesus, que “vê” - diz o texto - «um homem». Poucos viam Mateus como era: conheciam-no como aquele que estava «sentado no banco dos impostos» (v. 9). Com efeito, era cobrador de impostos: ou seja, alguém que cobrava os tributos em nome do império romano, que ocupava a Palestina. Em síntese, era um colaboracionista, um traidor do povo. Podemos imaginar o desprezo que o povo sentia por ele: era um “publicano”, assim se chamava. Mas, aos olhos de Jesus, Mateus é um homem, com as suas misérias e a sua grandeza. Estai atentos a isto: Jesus não se detém nos adjetivos, Jesus procura sempre o substantivo. “Este é um pecador, este é um tal pelo qual…” são adjetivos: Jesus vai à pessoa, ao coração, esta é uma pessoa, este é um homem, esta é uma mulher, Jesus vai à substância, ao substantivo, nunca ao adjetivo, põe de lado os adjetivos. E enquanto entre Mateus e o seu povo há distância – pois eles viam o adjetivo “publicano” - Jesus aproxima-se dele, porque cada homem é amado por Deus; “Até este desventurado?”. Sim, inclusive este desventurado, aliás Ele veio para este desventurado, diz o Evangelho: “Vim para os pecadores, não para os justos”. Este olhar de Jesus que é belíssimo, que vê o outro, quem quer que seja, como destinatário de amor, é o início da paixão evangelizadora. Tudo começa a partir deste olhar, que aprendemos com Jesus.
Podemos perguntar-nos: como vemos os outros? Quantas vezes vemos os seus defeitos e não as suas necessidades; quantas vezes etiquetamos as pessoas pelo que fazem ou por aquilo que pensam! Até como cristãos, dizemos: é ou não é dos nossos? Este não é o olhar de Jesus: Ele olha sempre para cada um com misericórdia, aliás, com predileção. E os cristãos são chamados a fazer como Cristo, olhando como Ele, especialmente para os chamados “distantes”. Efetivamente, a narração da chamada de Mateus conclui-se com Jesus que diz: «Não vim chamar os justos, mas os pecadores!» (v. 13). E se algum de nós se sente justo, Jesus permanece distante, Ele aproxima-se dos nossos limites e das nossas misérias, para nos curar.
Portanto, tudo começa pelo olhar de Jesus “Viu um homem”, Mateus. A isto segue-se - segunda passagem - um movimento. Antes do olhar, Jesus viu, depois a segunda passagem, o movimento. Mateus estava sentado no banco dos impostos; Jesus disse-lhe: «Segue-me!». E ele «levantou-se e seguiu-o» (v. 9). Observemos que o texto realça: “levantou-se”. Por que é tão importante este detalhe? Porque naquela época quem estava sentado tinha autoridade sobre os outros, que permaneciam em pé diante dele para o ouvir ou, como nesse caso, para pagar os impostos. Em síntese, quem estava sentado tinha poder. A primeira coisa que Jesus faz é separar Mateus do poder: do estar sentado para receber os outros, põe-no em movimento rumo aos outros, não recebe, não: vai até aos outros; fá-lo deixar uma posição de supremacia para o colocar no mesmo nível dos irmãos e para lhe abrir os horizontes do serviço. É isto que faz, e isto é fundamental para os cristãos: nós, discípulos de Jesus, nós, Igreja, permanecemos sentados à espera que as pessoas venham, ou sabemos levantar-nos, pôr-nos a caminho com os outros, procurar os outros? É uma posição não cristã dizer: “Mas, que venham, estou aqui, que venham”. Não, vai tu procura-los, dá tu o primeiro passo.
Um olhar – Jesus viu - , um movimento – levanta-se - e terceiro, uma meta. Depois de se levantar e seguir Jesus, para onde irá Mateus? Poderíamos imaginar que, tendo mudado a vida daquele homem, o Mestre o conduziu para novos encontros, novas experiências espirituais. Não, ou pelo menos não imediatamente. Em primeiro lugar, Jesus vai a sua casa; ali, Mateus prepara-lhe «um grande banquete», no qual «participa uma grande multidão de publicanos» (Lc 5, 29) isto é, pessoa como ele. Mateus regressa ao seu ambiente, mas volta mudado e com Jesus. O seu zelo apostólico não começa num lugar novo, puro, num lugar ideal, distante, mas lá, começa onde vive, com as pessoas que conhece. Eis a mensagem para nós: não devemos esperar ser perfeitos e ter percorrido um longo caminho atrás de Jesus para dar testemunho d’Ele; o nosso anúncio começa hoje, lá onde vivemos. E não começa procurando convencer os outros, convencer não: mas testemunhando todos os dias a beleza do Amor que olhou para nós e nos fez levantar e será esta beleza, comunicar esta beleza que convencerá as pessoas, não comunicar a nós, mas o Senhor. Somos aqueles que anunciam o Senhor, não anunciamos a nós mesmos, nem anunciamos um partido político, uma ideologia, não: anunciamos Jesus. É preciso pôr Jesus em contato com as pessoas, sem as convencer, mas deixar que o Senhor convença. Com efeito, como nos ensinou o Papa Bento XVI, «a Igreja não faz proselitismo. Ao contrário, ela desenvolve-se por atração» (Homilia na Missa de Inauguração da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, Aparecida, 13 de maio de 2007). Não esqueçais isto: quando virdes cristãos que fazem proselitismo, que fazem uma lista de gente que venha… estes nãos são cristãos, são pagãos disfarçados de cristãos mas o coração é pagão. A Igreja não cresce por proselitismo, cresce por atração. Recordo que certa vez num hospital de Buenos Aires foram embora as religiosas que ali trabalhavam porque eram poucas e não podiam levar em frente o hospital e veio uma comunidade de irmãs da Coreia e chegaram, pensemos por exemplo numa segunda-feira, não me lembro o dia. Tomaram posse da casa das religiosas do hospital e na terça-feira desceram para visitar os doentes, mas não falavam uma palavra em espanhol, falavam apenas o coreano e os doentes estavam felizes, pois comentavam: “Ótimas estas religiosas, boas, excelentes” – Mas o que te disse a irmã? “Nada, mas com o olhar falou-me, comunicou-me Jesus”. Não comuniquemos a nós mesmos, mas com o olhar, com os gestos, comuniquemos Jesus. Esta é a atração, o contrário do proselitismo.
Este testemunho atraente, este testemunho jubiloso é a meta para a qual Jesus nos conduz com o seu olhar de amor e com o movimento em saída que o seu Espírito suscita no coração. E podemos pensar se o nosso olhar se assemelha ao de Jesus para atrair as pessoas, para aproximar à Igreja. Pensemos nisto.
Papa Francisco
Catequese na audiência geral 11.01.22
Texto: Retirado do Site do Vaticano - http://www.vatican.va/ em 15/01/2023;
Imagem: Retirada da "Google imagens" em 15/01/2023;