sábado, 25 de setembro de 2021
Jesus não dispensa a tua presença...
«Retirou-se Jesus com eles para um lugar chamado Getsêmani e disse-lhes: "Assentai-vos aqui, enquanto eu vou ali orar". E, tomando consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e a angustiar-se. Disse-lhes, então: "Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo". Adiantou-se um pouco e, prostrando-se com a face por terra, assim rezou: "Meu Pai, se é possível, afasta de mim este cálice! Todavia não se faça o que eu quero, mas sim o que tu queres"» (Mt 26, 36-39).
Texto: Retirado
do Site do Vaticano em 25.09.2021- http://www.vatican.va/
Imagem: Retirada da "Google imagens" em 25.09.2021-“Recriação da Paixão de Cristo em Vilar Maior”
Pastores na Europa: refletir, reconstruir, ver…
CONCELEBRAÇÃO
EUCARÍSTICA
COM OS
PARTICIPANTES NA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DO CONSELHO
DAS
CONFERÊNCIAS EPISCOPAIS DA EUROPA
(C.C.E.E.)
HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
Basílica de São Pedro
Quinta-feira, 23 de setembro de 2021
Temos três verbos que, hoje, nos oferece a Palavra de Deus e que
nos interpelam como cristãos e pastores na Europa: refletir, reconstruir, ver.
Refletir é
a primeira coisa que o Senhor convida a fazer por meio do profeta Ageu:
«Refleti, no vosso coração, sobre o caminho que tomastes». Di-lo duas vezes ao
povo (Ag 1, 5.7). E sobre que aspetos do seu caminho devia refletir
o povo de Deus? Ouçamos o que diz o Senhor: «É então tempo para vós habitardes
em casas confortáveis, enquanto esta casa está em ruínas?» (1, 4). Regressado
do exílio, o povo preocupara-se por arranjar as suas casas; agora contenta-se
com viver cómodo e tranquilo em casa, enquanto o templo de Deus está em ruínas
e ninguém o reconstrói. Este convite a refletir interpela-nos: de facto, também
hoje na Europa nós, cristãos, somos tentados a acomodar-nos nas nossas
estruturas, nas nossas casas e nas nossas igrejas, nas nossas seguranças
proporcionadas pelas tradições, na satisfação por um certo consenso, enquanto
em redor os templos se esvaziam e Jesus fica cada vez mais esquecido.
Reflitamos! Quantas pessoas deixaram de ter fome e sede de Deus!
Não porque sejam más, mas porque falta quem lhes abra o apetite da fé e
reacenda a sede que há no coração do homem: aquela «concriada e já perpétua
sede» de que fala Dante (Paraíso, II, 19) e que a ditadura do consumismo
– ditadura leve, mas sufocante – tenta extinguir. Muitos são levados a sentir
apenas necessidades materiais, não a falta de Deus. E com certeza
preocupamo-nos com isso, mas verdadeiramente quanto nos importamos? É fácil
julgar quem não crê, é cómodo elencar os motivos da secularização, do
relativismo e de tantos outros ismos, mas no fundo é estéril. A
Palavra de Deus leva-nos a refletir sobre nós mesmos: sentimos amizade e
compaixão por quem não teve a alegria de encontrar Jesus ou a perdeu? Estamos
tranquilos porque no fundo não nos falta nada para viver, ou inquietos ao ver
tantos irmãos e irmãs longe da alegria de Jesus?
E o Senhor, por meio do profeta Ageu, pede ao povo para refletir
sobre outra coisa. Diz assim: «Comestes mas não vos saciastes; bebestes, mas
não apagastes a vossa sede; vestistes-vos, mas não vos aquecestes» (1, 6).
Enfim, o povo tinha tudo o que queria, e não era feliz. Que lhe faltava? No-lo
sugere Jesus com palavras que parecem recalcar as de Ageu: «Tive fome e não me
destes de comer, tive sede e não me destes de beber, (…) estava nu e não me
vestistes» (Mt 25, 42-43). A falta de caridade causa infelicidade,
porque só o amor sacia o coração. Só o amor sacia o coração. Fechados no
interesse pelas próprias coisas, os habitantes de Jerusalém perderam o
sabor da gratuidade. Também este pode ser o nosso problema: concentrar-se
sobre as várias posições da Igreja, os debates, as agendas e estratégias, e
perder de vista o verdadeiro programa que é o do Evangelho: o zelo da caridade,
o ardor da gratuidade. O caminho de saída dos problemas e fechamentos é
sempre o do dom gratuito; não há outro. Reflitamos nisto.
E depois de ter refletido, temos o segundo passo: reconstruir. «Reedificai a
[minha] casa»: pede Deus através do profeta (Ag 1, 8). E o povo
reconstrói o templo. Cessa de contentar-se com um presente tranquilo, e
trabalha para o futuro. E como havia gente que era contrária, diz-nos o Livro
das Crónicas que trabalhavam com uma mão nas pedras, para construir, e a outra
na espada, para defender este processo de reconstrução. Não foi fácil
reconstruir o templo. Disto precisa a construção da casa comum europeia: deixar
as conveniências do imediato para voltar à visão clarividente dos pais
fundadores, uma visão – atrever-me-ia a dizer – profética
e de conjunto, porque não procuravam os consensos do momento, mas sonhavam
o futuro de todos. Assim foram construídas as paredes da casa europeia e só as,
é verdade sim se poderão robustecer. O mesmo vale também para a Igreja, casa de
Deus. Para torná-la bela e acolhedora, é necessário olhar juntos para o futuro,
não restaurar o passado. Infelizmente está na moda aquele “restauracionismo” do
passado que nos mata, que nos mata a todos. Sem dúvida, devemos partir dos
alicerces, das raízes – isto sim, é verdade –, porque dali se reconstrói: a
partir da tradição viva da Igreja, que nos alicerça sobre o essencial, ou seja,
o anúncio feliz, a proximidade e o testemunho.
Daqui se reconstrói: a partir dos alicerces da Igreja dos primórdios e de
sempre, da adoração de Deus e do amor ao próximo, não a partir dos próprios
gostos de cada um, nem dos pactos e negociações que se possam fazer agora –
digamos – para defender a Igreja e defender a cristandade.
Amados Irmãos, quero agradecer-vos por este trabalho não fácil de
reconstrução, que realizais com a graça de Deus. Obrigado por estes primeiros
50 anos ao serviço da Igreja e da Europa. Encorajemo-nos, sem nunca ceder ao
desânimo e à resignação: somos chamados pelo Senhor a uma obra esplêndida, a
trabalhar para que a sua casa seja cada vez mais acolhedora, para que cada um
possa entrar e viver nela, para que a Igreja tenha as portas abertas a todos e
ninguém se sinta tentado a concentrar-se apenas em olhar e trocar as
fechaduras. As pequenas coisas que nos deliciam… E somos tentados. Mas não! A
mudança tem de vir doutra parte, vem das raízes. A reconstrução vem doutra
parte.
O povo de Israel reconstruiu o templo com as suas próprias mãos.
Os grandes reconstrutores da fé do continente fizeram o mesmo – pensemos nos
Padroeiros. Puseram em jogo a sua pequenez, confiando em Deus. Penso nos
Santos, como Martinho, Francisco, Domingos, Pio que hoje comemoramos; penso nos
Patronos como Bento, Cirilo e Metódio, Brígida, Catarina de Sena, Teresa
Benedita da Cruz. Começaram por si mesmos, por mudar a própria vida, acolhendo
a graça de Deus. Não se preocuparam com os tempos sombrios, as adversidades e
qualquer divisão, que sempre existiu. Não perderam tempo a criticar e
culpabilizar. Viveram o Evangelho, sem se importar com a relevância e a
política. Assim, com a força suave do amor de Deus, encarnaram o seu estilo de
proximidade, de compaixão e de ternura – o estilo de Deus: proximidade,
compaixão e ternura – e construíram mosteiros, bonificaram terras, deram alma a
pessoas e países: nenhum programa “social” (entre aspas), só o Evangelho. E com
o Evangelho progrediram.
Reedificai a minha casa. O verbo está conjugado no
plural. Toda a reconstrução se realiza em conjunto, sob o signo da unidade, ou
seja, com os outros. Pode haver diferentes visões, mas deve-se sempre guardar a
unidade. Porque, se guardarmos a graça do todo, o Senhor edifica mesmo lá onde
nós não conseguimos. A graça do conjunto. Esta é a nossa chamada: ser Igreja,
formar um só Corpo entre nós. É a nossa vocação, como Pastores: reunir o
rebanho, não o dispersar nem mesmo preservar em belos recintos fechados. Isto é
matá-lo. Reconstruir significa fazer-se artesãos de comunhão, tecedores de
unidade a todos os níveis: não por estratégia, mas pelo Evangelho.
Se edificarmos desta forma, daremos aos nossos irmãos e irmãs a
chance de ver: é o
terceiro verbo. Aparece na conclusão do Evangelho de hoje, onde se diz que
Herodes procurava «ver Jesus» (cf. Lc 9, 9). Hoje, como então,
fala-se muito de Jesus. Então dizia-se que «João ressuscitara dos mortos, (...)
Elias aparecera, (...) um dos profetas antigos ressuscitara» (Lc 9,
7-8). Todos eles mostravam apreço por Jesus, mas não compreendiam a sua
novidade e encerravam-No em esquemas já vistos: João, Elias, os profetas...
Jesus, porém, não pode ser classificado nos esquemas do «ouvi dizer» ou do «já
visto?… Jesus sempre é novidade, sempre. O encontro com Jesus gera em ti
maravilha, e se, no encontro com Jesus, não sentes esta maravilha, não
encontraste Jesus
Muitos na Europa pensam que a fé seja algo já visto, que pertence
ao passado. Porquê? Porque não viram Jesus em ação nas suas vidas. E muitas
vezes não O viram, porque nós não O mostramos suficientemente com as nossas
vidas. Pois Deus vê-Se nos rostos e nos gestos de homens e mulheres
transformados pela sua presença. E se os cristãos, em vez de irradiarem a
alegria contagiante do Evangelho, repropuseram esquemas religiosos gastos,
intelectualistas e moralistas, as pessoas não veem o Bom Pastor. Não reconhecem
Aquele que, apaixonado por cada uma das suas ovelhas, a chama pelo nome,
procura-a e trá-la de volta colocando-a aos ombros. Não veem Aquele de Quem
pregamos a incrível Paixão, precisamente porque Ele tem uma única paixão: o
homem. Este amor divino, misericordioso e impressionante é a novidade perene do
Evangelho. E pede-nos a nós, amados Irmãos, opções sábias e ousadas, feitas em
nome daquela ternura louca com que Cristo nos salvou. Não nos pede para
demonstrar, pede-nos para mostrar Deus, como fizeram os Santos: não por
palavras, mas com a vida. Pede oração e pobreza, pede criatividade e
gratuidade. Ajudemos a Europa de hoje, doente de cansaço (esta
é a doença da Europa atual) a reencontrar o rosto sempre jovem de Jesus e da
sua esposa. Não podemos fazer outra coisa senão dar-nos completamente a nós
mesmos para que se veja esta beleza sem ocaso.
Texto: Retirado
do Site do Vaticano em 25.09.2021- http://www.vatican.va/
Imagem: Retirada da "Google imagens" em 25.09.2021